Creio no Espírito Santo, Senhor que dá a vida, e procede do Pai e do Filho; e com o Pai e o Filho é adorado e glorificado: Ele que falou pelos profetas.

14 junho 2010

CARISMAS 1° Coríntios 12,4-11



Encarte da Revista Renovação nº 54 Janeiro/Fevereiro de 2009

BOLETIM Nº 43

CARISMAS


1. INTRODUÇÃO


Os carismas eram comuns no início da Igreja. Bas­ta ler os Atos dos Apóstolos e as cartas de São Paulo. Depois, por alguns séculos eles se mantiveram restritos aos grandes santos. Assim, pensava-se que os carismas eram para alguns homens e mulheres reconhecidamen­te santos, místicos e penitentes.
Os Carismas, portanto não são novidades trazidas pela Renovação Carismática Católica, a não ser no as­pecto do seu exercício nos tempos atuais. Foi o docu­mento conciliar Lumen Gentium que traçou as primei­ras diretrizes sobre carismas para os tempos atuais:
“...Não é apenas através dos sacramentos e dos ministérios que o Espírito Santo santifica e conduz o Povo de Deus (...), mas, repartindo seus dons a cada um como lhe apraz (I Cor 12,11), distribui entre os fiéis de qualquer classe mesmo graças especiais (...) Estes carismas, quer eminentes, quer mais simples e mais amplamente difundidos, devem ser recebidos com gratidão e consolação, pois que são perfeita­mente acomodados e úteis às necessidades da Igre­ja. Uma vida mais plena no Espírito Santo, a unção carismática do Espírito Santo, contempla a Igreja com toda uma amplitude de dons.”1
Esses dons de adoração, louvor e oração apro­fundam a dimensão contemplativa da fé cristã e as dádivas de serviço animam a vida de santidade. “To­dos os carismas trazem nova docilidade ao Espírito, a fé esperançosa na salvadora intervenção de Deus nas questões humanas, acentuado zelo pelo Evan­gelho e o respeito pela autoridade da Igreja.”2
Nesse sentido, é necessário afirmar a atualidade dos carismas e promovê-los como realidades necessá­rias à evangelização e ao crescimento pessoal de cada cristão. “A vida batizada no Espírito é marcada por uma experiência de união dinâmica com Deus e também por uma experiência de carismas doados pelo Espírito San­to.”3
São Pedro aviva essa esperança: “Pois a promessa é para vós, para os vossos filhos e para todos os que ouvirem de longe o apelo do Senhor, nosso Deus” (At 2,39). A promessa é, portanto, para todos os tempos.
Contém abalizar dons efusos, que é matéria deste estudo, dos dons infusos,que também são carismas do Espírito, mas que se distinguem daqueles:4


a. Dons infusos — temor de Deus, fortaleza, piedade, conselho, conhecimento, sabedoria e discer­nimento (cf. Is 11,1-3). Num total de sete, esses dons são concedidos para a pessoa (infundidos), aprimoram e reforçam as virtudes, constituindo-se em benefícios para o crescimento pessoal;


b. Dons efusos — línguas, profecia, interpretação, ciência, sabedoria, discernimento dos espíritos, cura, fé e milagres (cf. I Cor 12,4-10). Num total de nove, es­ses dons são para o serviço e o bem comum e são con­cedidos como manifestações atuais, de acordo com a vontade de Deus.

Aqui serão estudados os carismas efusos, que são realidades manifestas nos grupos de oração da Renovação Carismática, constituindo-se num dos as­pectos de sua identidade:5


2. CONCEITO

Os carismas são dons, graças, presentes, dados pelo Espírito Santo, “mas um e o mesmo Espírito dis­tribui todos esses dons, repartindo a cada um como lhe apraz” (ICor 12,11):
“A palavra ‘carisma (chárisma) é oriunda da língua grega e significa ‘dom gratuito’. Ela encontra seu signifi­cado fundamental na raiz ‘char’ que indica tudo aquilo que produz bem-estar; assim é que temos cháris, que­rendo significar ‘graça’, ‘dom, ‘favor, ‘bondade’; charí­zomai, no sentido de fazer um dom gratuito, mostrar-se generoso. O sufixo ‘-ma’ exprime na língua grega o re­sultado da acão indicada pelo verbo, o seu efeito, o que pode denota r também o caráter objetivo da concessão e da exeriência da graça. Portanto, o significado geral e fundamental de ‘chárisma’ poderia ser: dom concedi­do por pura benevolência, que é, ao mesmo tempo, o objetivo e o resultado da graça divina, do presente que Deus faz aos homens.”6
Em sentido restrito, os carismas são manifesta­ções extraordinárias do Espírito Santo para proveito comum7. Eles exercem papel fundamental na evange­lização. Padre Luiz Fernando R. Santana aprofunda o assunto e alerta:
“ Paulo tem em alta estima a presença e ação dos dons e carismas do Espírito na vida da Igreja e dos fiéis batizados, até mesmo exortando a co¬munidade a que tivesse o cuidado de não extinguir o Espírito, de não desprezar as profecias, mas de verificar tudo com um discernimento sábio e só-brio (cf. ITs 5,19-22). Disso in­ferimos que, para Paulo, os carismas e os ministérios são os instru-mentais privilegiados na edificação do Corpo de Cristo e na realização do desígnio de Deus na histó­ria; ambas as realidades possuem igual importância e dignidade, uma vez que emanam do mesmo Espírito e estão ordenadas, cada uma naquilo que lhe é específi­co, a um mesmo fim.”8
Pelo seu próprio caráter, dom não implica santidade. Na verdade, qualquer pessoa pode rece­ber os presentes de Deus (cf. At 10,34). Porém, não se pode esquecer que quem não tem vida espiritual e reta in¬tenção de agradar a Deus, certamente usará mal os ca¬rismas, pois não cultiva a necessária união com Cris­to (cf. Jo 15,4-5), para querer o que Deus quer.



3. QUANDO UTILIZAR OS CARISMAS

E difícil precisar em que momentos utilizar os carismas do Espírito. O seu exercício é quase sempre oportuno, sobretudo quando as situações o exigem. Sendo a graça do Espírito uma realidade perene na vida humana, os carismas por sua vez, tornam-se também profusamente inseridos na vida daqueles que foram batizados.
No entanto, é preciso dizer que os carismas são re­alidades atuais e não adquiridas por posse. E o Es¬pírito que opera tudo em todos (cf. ICor 12,6-7), a seu querer (ICor 12,8-10). Não seria justo, portanto, atribuir a uma pessoa ou grupo de pessoas específico a contenção exclusiva de qualquer manifestação carismática;9 nem mesmo se pode dizer que alguém “tem” este ou aquele dom, pois cada manifestação é única,10 mesmo que se processe com muita frequência através de determina­das pessoas. Talvez ao dom de línguas possa se atribuir um caráter mais perene e sob controle, por se tratar de um dom de oração, mais para edificação pessoal (cf. ICor 14,4).
Contudo, não se pode cair no equívoco de reduzir os dons do Espírito a algumas ocasiões especiais. Eles foram dados em profusão nos tempos atuais. Pode ser cultivada uma constante expectativa em relação à sua manifesta­ção, como para o derramamento do Espírito.11
A missão da Renovação Carismática Católica é evange¬lizar a partir do batismo no Espírito Santo, for­mando o povo de Deus em santidade e serviço. Para evangelizar o povo de Deus com unção e poder são ne­cessários os carismas.
“A ‘força do Espírito Santo’ (At 1,8) derramada nos corações dos cristãos, manifestação do amor e do poder de Deus, provoca uma significativa diferen­ça entre a ação evangelizadora de uma pessoa que se deixa conduzir por ela e uma que age sem ela. Aquele que evangeliza com os dons carismáticos multiplica as possibilidades humanas. A investidura carismática em comunidades da Igreja, em todo mundo, tem gerado e sustentado grande número de evangelistas dedicados eficientes, com novo vigor, com nova capacitação, nova alegria, novo jubilo, nova exaltação e louvor, levando em si o poder transformador do Espírito (cf. ICor 2,1-5) que toca crianças, jovens, adultos e idosos de todo tipo de raça e cultura”.12
O uso dos carismas não é só um direito, é um dever de todos os fiéis. “Da aceitação destes carismas, mes­mo dos mais simples, nasce em favor de cada um dos fiéis (...) o dever de exercê-los para o bem dos homens e a edificação da Igreja dentro da Igreja e do mundo”.13
Pode-se constatar na prática apostólica que, quando a evangelização é acompanhada de caris­mas, colhem-se frutos abundantes: os carismas fazem diferença e são eficazes na evangelização, quando exercidos na caridade.


4. OS DONS EFUSOS E A CARIDADE


Jesus deu o mandamento do amor: “Amai-vos uns aos outros, como eu vos amo” (Jo 15,12.17). São Paulo apresenta o trabalho apostólico realizado no amor. Não um amor qualquer, mas o amor “ágape”, amor doação a Cristo e aos irmãos: (Icor 13).
Os capítulos 12 a 14 da carta aos Coríntios, que tratam dos carismas e suas manifestações, são verda-deiros referenciais para se viver a vida nova, guiada pelo Espírito Santo, exercendo os seus dons de ma¬neira au­têntica e frutuosa. Eles contêm regras básicas e orien­tações seguras. Outras recomendações podem ser en­contradas em Ef 4,15.30; Rm 12,6-8; 13,8-10; e ITess 5,14-15. 19-21.
Jesus dá a regra para verificar o valor do trabalho: “Pelos frutos os conhecereis” (Mt 7,16). São Paulo tam­bém fala: “o fruto do Espírito é caridade, alegria, paz, paciência, afabilidade, bondade, fidelidade, brandura, temperança. Contra estas coisas não há lei” (Gl 5,22- 23). Dessa forma, o bom uso dos carismas é garantido pelo amor,14 que é o dom por excelência e que atribui sentido aos outros dons.15 Os carismas, portanto, são fundamentados na caridade:
“Sejam extraordinários, sejam simples e humides, os carismas são graças do Espírito Santo que, direta ou indiretamente, têm uma utilidade eclesial, ordenados que são à edificação da Igreja, ao bem dos homens e às necessidades do mundo. Os carismas devem ser aco­lhidos com reconhecimento por aquele que os recebe, mas também por todos os membros da Igreja. São uma maravilhosa riqueza de graça para a vita¬lidade apostó­lica e para a santidade de todo o Corpo de Cristo, desde que se trate de dons que provenham verdadeiramen­te do Espírito Santo e que sejam exercidos de maneira plenamente conforme aos impulsos autênticos deste mesmo Espírito, isto é, segundo a caridade, verdadeira medida dos carismas”.16



5. Os carismas devem ser pedidos com fé e exerci­dos na humildade

É exatamente por causa do amor que os dons efu­sos devem ser almejados. A moti¬vação deve ser o uso em benefício dos outros, para ajudar o povo de Deus a alcançar a santidade.
Por isso, os carismas devem ser pedidos com fé e sem temor. Embora eles sejam distribuídos conforme apraz ao Espírito, nada impede que o crente aspire e peça os dons, para que seu testemunho seja permeado de sinais (cf. ICor 2,4-5). “Só aqueles que reconhecem o valor dos dons na sua vida cristã e no serviço aos irmãos são impulsionados a pedi-los ao Pai, como Jesus mes­mo nos ensinou: ‘Pedi, e dar-se-vos-á; buscai e acha­reis; batei e abrir-se-vos-á. Pois todo aquele que pede, recebe; aquele que procura, acha; e ao que bater se lhe abrirá’ (Lc 11,9-10)”.17
Para o exercício prático dos carismas, não se deve esquecer três coisas fundamentais:


A. HUMILDADE
Deus constituiu a Igreja como um corpo (cf. ICor 12,12-29), de tal maneira que um carisma só se pie-ni­fica no conjunto da comunidade. “Exercer os carismas na humildade é exercê-los sem exibicionismo, sem bus­car prestígio, honra, poder. (...) E também exercê-los sem auto-suficiência (cf. Mt 18,3-4), sem individualis­mo, sabendo que necessitamos da ajuda dos irmãos para confirmar ou discernir a vontade de Deus para o seu povo.. ,”.18


B. HARMONIA
O uso dos carismas será tanto mais saudável e útil quanto as pessoas que a eles se abrirem forem equili­bradas emocionalmente e orantes o suficiente para sa­ber distinguir a ação do Espírito de eventuais devaneios da pessoa humana.19 É necessário ter respeito pêlos dons de Deus; “não podemos exercê-los irresponsável e indiferentemente, com desprezo, de forma inconse­quente, olhando os nossos próprios interesses, ou dan­do aos carismas um relevo tão singular e único como se fossem bens totais e absolutos sobre os quais não há nada mais excelente e primeiro”.20


C. ORDEM

A ordem no exercício dos carismas é uma exten­são da harmonia, mas supõe autoridade e obediên­cia. O cristão pode ser instrumento da manifestação autêntica do Espírito Santo, mas não deve esquecer que até o espírito dos profetas deve estar-lhe submisso (cf. ICor 14,32).
Portanto, os carismas devem ser exercidos na obe¬diência a Cristo e às autoridades constituídas. “Mas faça-se tudo com dignidade e ordem” (ICor 1.4,40).



6. PALAVRA DA IGREJA

E oportuno destacar algumas asserções do Magis­tério da Igreja em relação aos carismas e seu uso:
a. “O Espírito Santo, ao confiar à Igreja-comunhão os diversos ministérios, enriquece-a com outros dons e impulsos especiais, chamados carismas. Podem assu­mir as mais variadas formas, tanto como expressão da liberdade absoluta do Espírito que os distribui, como em resposta às múltiplas exigências da história da Igre­ja. A descrição e a classificação que os textos do Novo Testamento fazem desses dons são um sinal da sua grande variedade”;
b. “ Também em nossos dias não falta o florescer de diversos carismas entre os fiéis leigos, homens e mulheres. São dados ao indivíduo, mas também podem ser partilhados por outros, e de tal modo perse¬veram no tempo como uma herança preciosa e viva, que ge­ram uma afinidade espiritual entre as pessoas;21
c. “Para exercerem este apostolado (os leigos), o Espírito Santo, que opera a santificação do povo de Deus por meio do ministério e dos sa¬cramentos, con­cede também aos fiéis dons particulares (cf. ICor 12,7), ‘distribuindo-os por cada um conforme lhe apraz’ (ICor 12,7-11}, a fim de que ‘cada um ponha em serviço dos outros a graça que recebeu’, e todos atuem ‘como bons administradores da multiforme graça de Deus’ (IPd 4,10), para a edificação, no amor, do corpo todo. (cf. Ef4,16). (...) Nenhum carisma está dispensado da sua referência e dependência dos pastores da Igreja. O Con­cílio escreve com palavras claras que o juízo acerca da sua (dos carismas) autenticidade e reto uso pertence àqueles que presidem a Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito, mas julgar tudo e conservar o que é bom (cf. ITs 5,12 e 19-21), de modo que todos os carismas concorram, na sua diversidade e complementaridade, para o bem comum.23
As palavras da Igreja tiram o medo e as dúvidas quanto à necessidade e utilidade dos carismas, bem como o direito que os fiéis leigos têm de usá-los para o bem comum. O Catecismo da Igreja Católica segue a mesma firme orientação:
“O Espírito Santo é o princípio de toda a ação vi­tal e verdadeiramente salutar em cada uma das diver­sas partes do corpo. Ele opera de múltiplas maneiras a edificação do corpo inteiro na caridade, pela Palavra de Deus (...), pelas virtudes, que fazem agir segundo o bem, e, enfim, pelas múltiplas graças especiais (cha­madas de ‘carismas’), através das quais ‘torna os fiéis aptos e prontos a tomarem sobre si os vários trabalhos e ofícios que contribuem para a renovação e maior in­cremento da Igreja”.24



7. CONCLUSÃO

É importante tomar consciência de que todo bem, todo dom, todo serviço prestado ao Reino de Deus em nome de Jesus, acontece sob inspiração do Espíri­to Santo. Sem Ele nada é eficaz para o Reino de Deus. “Nunca será possível haver evangelização sem a ação do Espírito”.25
Os grupos de oração não devem ter medo nem resistir aos dons do Espírito, mas procurar conhecê-los cada vez mais para bem utilizá-los.


_____________________________________


1. N.4 e 12.
2. Conferência Católica dos EUA, Declaração pastoral sobre a RCC, p.7.
3. Killian MCDONNELL, George Montague, Avivar a Chama, p.32.
4. Essa distinção é didática, mas com fundamento bíblico – teológico; apesar disso, não tem a intenção de segmentar a ação do Espírito Santo nem de encerrar dentro dela todas as espécies de carismas.
5. Cf. RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA, Identidade da Renovação Carismática Católica, p. 27-28.
6. Luis Fernando R. SANTANA, Recebereis a forca do Espírito Santo, p. 77.
7. Cf. A. VAN DEN BORN, Dicionário enciclopédico da Bíblia, p. 245.
8. Batizados no Espírito, p. 43-44.
9. Cf. SAGRADA CONGREGAÇÃO PARA A DOUTRINA DA FÉ, Instruções sobre as orações para alcançar de Deus a cura, p. 14.
10.Cf.lbid., p. 10.
11. Cf. Ronaldo José de SOUSA, O impacto da Renovação Carismática, p. 23.3
19. Cf. Ronaldo José de SOUSA, Pregador ungido, p. 21-22.
20. RENOVAÇÃO CARISMÁTICA CATÓLICA, Carismas, p. 43.
21. JOÃO PAULO II, Christifidelis Laici, n. 24. 22.lbid,,n. 24.
23. lbid, n. 24, Cf, CONCÍLIO ECUMÉNICO VATICANO II, Lumen Gentium. n. 12.
24. N.798
25. Paulo VI, Evangelli Nuntiandi, n. 75

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